Depois de fazer exercícios, decidiu caminhar de volta para casa.
Caminhava lentamente para que o corpo se acalmasse. A mochila preta e vermelha
pendia no ombro direito; os cabelos, que já precisavam de aparo, começavam a
ficar levemente molhados por causa da garoa
fina. Não tinha pressa de chegar. Tentava afastar a ideia, recusava-lhe a
atenção, certo de que se esvairia dentro de alguns instantes. E, conforme
previa, se esvaía. Ele dava-se como o vencedor, sem considerar que o ciclo retomava-se
a cada oportunidade, entremeava cada pensamento.
Temia ter de reconhecer o questionamento. Temia o momento em
que não conseguisse mais domá-lo, temia aquela hora em que o axioma invade,
toma conta da conta e se instala na alma, como o mais devastador tsunami. Dali,
sabia que não haveria volta. Por isso, evitava dar asas ao raciocínio. Sabia
que podia ser custoso. Começou a correr; gostava disso. E gostava da distração
que o movimento lhe causava. Uma gota escorria da franja e pingara no rosto, à
porta de casa.
Entrou, jogou a mochila no chão e prosseguiu. Viu pelas
costas aquela que o esperava; ela virou-se e gritou de felicidade. Ele fez um
sorriso. Ela exclamou novamente em voz alta. A dúvida alfinetou com força. Já era
tarde, não conseguiria contê-la. Fez outro sorriso e subiu as escadas. Calou-se,
na certeza de que amanhã seria um novo dia. Sempre esperava o novo dia, depois
da noite que tudo dissolvia. Por dentro, tudo emudeceu.